domingo, 28 de dezembro de 2008

Longe do Paraíso

"Longe do Paraíso", assim como a "Voz de Eva", e como será o "Fruto Verde e Proibido" (que ainda não estreou), uma das seçoes recorrentes do blog. Vou começar com uma coisa que veio repentina, depois de uma tarde de sono intenso, seguida da mais plena sensação de não pertencer (porque pertenço a um mundo que é proibido), acompanhada de um pouco de vinho e nostalgia.

Distanciemo-nos!!!





" "

Fiquei a tarde toda lá, sentado, esperando. O vento forte e o sol.

O lugar ignorado. Nada de meu, além dos olhos. A roupa não era minha, o perfume doce, os óculos para perto, o livro em outra língua, nada. Só sabia que era eu, porque, enfim, sempre se sabe quando se é. Ou não?

Fiquei sentado numa pedra - uma pedra no meio do caminho. Inicialmente assustado, inicialmente atormentado pela cor amarela que predominava. E principalmente, encantado: o horizonte não sofria nenhuma agressão: tudo era plano: céu e terra, juntos.

Parte do tempo da espera dediquei às reminiscências, às saudades que foram se sobrepondo uma a uma - minha infância em frente à serra branca me apertou o peito um pouco mais que as outras.

Os amigos que tinham morrido estavam todos ali, sujos de terra, com cheiro de açude e joelhos ralados de futebol e pequenos furtos.

E tinha minha avó lavando roupa no riacho: Ela cantava e a espuma branca - que formava em filete agudo um outro pequeno rio - seguia rumo às terras de Manelim, de quem eu roubaria os frutos dourados e suculentos do Pé de Manga Sete, não fosse o medo ( o medo que sobrevive em mim em outros tons ) de ser apanhado por Maria Aleivosia ( A mulher que, louca ou apaixonada, matou a família e se escondeu na serra) que, nas tardes modorrentas, atraía os moleques arteiros num cantar suave e traiçoeiro: _ Ê ô, espera eu!

Tinha o ritmo da mão de pilão nas mãos das mulheres da família: aquela arte graça disfarçada de trabalho árduo em que eu me infiltrava mudo - os olhos já eram os desta tarde - para ouvir, entre as estridentes gargalhadas, as mentiras sobre as outras mulheres.

E pensando em mulheres, impossível não pensar nas suas missões na hora da morte. Torrar o café e fazê-lo forte e amargo. Colher folhas de laranjeira. Lembrar de um parente que ainda não chegou. Aguar a frente da casa. Banhar o corpo, vesti-lo e dizer que parecia que sorria.

... (...) !!! (!!!) ??? (???)

Era preciso parar no meio da estrada, desertificá-la, descer do carro e caminhar muito até que ele parecesse distante o suficiente para não ensejar a desistência.

Era preciso ficar sentado algumas horas, trasmutando-se para não parecer ridículo.

Era preciso ficar sozinho até não se reconhecer, para ter a sensação de.

A tarde toda eu fiquei ali, outra pessoa, esperando que alguma coisa acontecesse. Tentando reconhecer as cicatrizes, as coisas que não me eram. A tarde toda. Mas só as nuvens passavam, as sombras.

Ir embora ia doer.

Um comentário: